29.7.08

02/08 - O Fantasma da Liberdade (Luis Buñuel)

Neste Sábado Dia 02/08 às 19:30h
No SESC Cineclube Silenzio
ENTRADA GRATUITA






Várias situações independentes se sucedem, num filme episódico, sempre ligadas por um dos personagens. Mais uma parceria de Luis Buñuel com o roteirista Jean-Claude Carrière. Trama surreal e livre, uma sátira onírica e nonsense, na qual o diretor apela para a total inversão de valores no ataque à religião, à pátria e à família. O humor é erótico e violento. Uma das obras mais características de um diretor amaldiçoado pela igreja. Sem dúvida, mais uma obra-prima surrealista.

Gênero Arte
Atores Jean-Claude Brialy, Monica Vitti, Paul Frankeur, Paul Le Person, François Maistre, Claude Piéplu, Marie-France Pisier, Jean Rochefort, Milena Vukotic, Bernard Verley, Adriana Asti, Julien Bertheau,
Direção Luis Buñuel,
Idioma Francês,
Legendas Português
Ano de produção 1974
País de produção França, Itália,
Duração 104 min.
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Poesia, Surrealismo e Luis Buñuel:

“Um fantasma ronda o burlesco, O Fantasma da Liberdade

Laysmara Carneiro Edoardo

Socióloga

laysedoardo@gmail.com

“Para um neo-realista, (...) um copo é um copo e nada mais; nós o vemos ser tirado do armário, enchido de bebida, levado à cozinha onde a empregada o lava e talvez o quebre, o que pode ou não custar-lhe o emprego, etc. Mas esse mesmo copo, visto por seres diferentes, pode ser milhares de coisas, pois cada um transmite ao que vê uma carga de afetividade; ninguém o vê tal como é, mas como seus desejos e seu estado de espírito determinam. Luto por um cinema que me faça ver esse tipo de copo, porque este cinema me dará uma visão integral da realidade, ampliará meu conhecimento das coisas e dos seres e me abrirá o mundo maravilhoso do desconhecido, de tudo o que não encontro nem no jornal nem na rua.”

Luis Buñuel

Falar de Luis Buñuel exige, no mínimo, total desprendimento de normas, regras ou recalques. Trata-se, na verdade, de buscar no mais grotesco, no mais ridículo do próprio espectador, a função poética do cinema lírico do diretor. Buñuel realizou com maestria, ao longo de 38 filmes, o romance entre poesia e surrealismo num cinema “cru” de esteticismos, embora rico de sentidos sobre o cômico de alguns comportamentos civilizados. Exemplo disso é o longa O Fantasma da Liberdade, que já em seu título traz um trocadilho sobre a primeira frase do Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels: “Um fantasma ronda a Europa, o fantasma do comunismo”. Ora, sobre este aspecto, pouco pode ser dito, pois o diretor, defensor ferrenho das vias alternativas ao capitalismo e ao comportamento civilizado, buscou em várias fontes a fundamentação para seu surrealismo apaixonado.

O Manifesto do Surrealismo, escrito por André Breton em 1924, já apresentava em sua constituição a efervescência do período pós Primeira Guerra Mundial que a Europa, especialmente, estava vivendo. Aliás, o texto centra-se, sobretudo, na crítica à arte clássica não engajada, à arte contemplativa sem posicionamento crítico para com a realidade social, à art per l´art e o esteticismo vazio. O Surrealismo propõe, ao contrário disso, o uso da imaginação como fundamento básico para a produção artística de seus adeptos, embora não se constituísse, e nem tivesse o desejo de ser uma escola artística. Tratava-se meramente de um enfrentamento marginal aos criticados por eles.

Por outro lado também, Breton contemplou e recuperou antecessores tais como Baudelaire e Sade, entre outros; que serviriam igualmente de base e inspiração para as obras dos demais surrealistas. Por exemplo, em Un Chien Andalou e em L´Age d´or, dos anos de 1929 e 1930, respectivamente, e os quais, segundo o próprio Buñuel, propiciaram sua entrada no círculo surrealista, referem-se claramente aos ‘malditos’ clássicos para a construção de seus discursos, utilizados constantemente para dar o ‘tom’ absurdo presente nas obras.

Tendo por base as “normativas” surrealistas, Buñuel cumpriu em seus dois primeiros filmes, em parceria com outros surrealistas tais como Salvador Dalí e Max Ernst, rigorosamente a crítica artística, concentrada especialmente nos ranços burgueses da sociedade européia do início de século XX. Aliás, críticas duras à religião e a moral, por exemplo, tornaram-se recorrentes em toda a obra buñuelesca por praticamente cinqüenta anos. Destarte, segundo Wanderson Lima¹, dois pontos caracterizam a postura de Buñuel diante do cinema, de forma que estas influências acabam por formalizarem-se em uma espécie de assinatura do diretor, desenvolvida no decorrer de sua trajetória como cineasta. Ou seja, “a recusa do esteticismo e a assunção da precariedade material como opção estético-ideológica [...] e, de outro lado, o uso da imaginação, do humor negro, da poesia como invectiva contra a racionalidade; a problematização e a complexificação do que chamamos realidade”.

Buñuel, portanto, vai fundo na crítica aos mundos sociais, econômico, políticos e culturais, empregando um humor ácido que pode ser confundido com ‘mau gosto’ por alguns. Contudo, a intenção de mostrar e explorar a ridicularidade de algumas considerações acerca do mundo é contemplada ao conduzir o espectador pelo universo das etiquetas e regras subvertidas, tal qual a seqüência do jantar, que merece muito destaque, embora não possa ser adiantada aqui sob pena de perder seu impacto no contexto fílmico.

Por todos estes motivos, O Fantasma da Liberdade não pode e nem deve ser vítima de uma sinopse, de forma que, definido, embora não limitado como obra surrealista, é garantia de um espetáculo cinematográfico onde há a tentativa de transformar o absurdo em natural e o burlesco em cotidianidade, fazendo com que a subversão seja identificada pelo público e interpretada à revelia de suas próprias vivências.

¹LIMA, Wanderson. Surrealismo e Quixotismo no Cinema de Luis Buñuel, In Revista de Cultura #52, Fortaleza, São Paulo – julho/agosto de 2006. disponível em http://www.revista.agulha.nom.br/ag52bunuel.htm

O Fantasma da Liberdade de Luis Buñuel

será exibido neste sábado dia 02/08 às 19:30h

No SESC Cineclube Silenzio em Cascavel.

A entrada é gratuita

21.7.08

26/07 - O Cozinheiro, o Ladrão, Sua Mulher e o Amante (Peter Greenaway)

Neste Sábado dia 26/07 às 19:30h
no SESC Cineclube Silenzio
ENTRADA GRATUITA



O gângster Albert Spica (Michael Gambon, de Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban) janta todas as noites no restaurante Le Hollandais em companhia de seus capangas e da esposa, Georgina (Helen Mirren). Cansada dos modos violentos e grosseiros do marido, Georgina flerta com um solitário freqüentador do restaurante, o bibliotecário Michael (Alan Howard).

Com a cumplicidade do chefe de cozinha francês, Richard (Richard Bohronger), os dois amantes fazem sexo às escondidas no banheiro e na despensa do restaurante, enquanto Albert devora prato após prato em sua mesa. Quando Albert descobre a traição da esposa, desfecha uma cruel vingança contra Michael, que por sua vez será vingado por Georgina.

Recheado de violência, escatologia e canibalismo, este filme do inglês Peter Greenaway é um banquete para os olhos. Com a cumplicidade do fotógrafo Sacha Vierny e do estilista Jean-Paul Gaultier, Greenaway realizou uma das mais requintadas obras-primas do cinema contemporâneo.


Gênero Drama
Atores Richard Bohringer, Michael Gambon, Helen Mirren, Alan Howard, Tim Roth, Ciarán Hinds, Liz Smith, Gary Olsen, Ewan Stewart, Roger Ashton-Griffiths,
Direção Peter Greenaway,
Idioma Inglês,
Legendas Português,
Ano de produção 1989
País de produção Inglaterra, França, Holanda,
Duração 124 min.
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Perfumaria em açougues

Vander Colombo

“Se você quiser contar histórias, seja um escritor e não um cineasta”

Peter Greenaway

Peter Greenaway me é assunto dos mais delicados, principalmente quando se trata de um assunto doméstico e qualquer sílaba que destoe me pareceria parricídio. Este senhor inglês me foi uma das maiores desculpas para escolher o ramo do cinema como única e derradeira condição de vida. E confesso: tenho ciúmes de Peter Greenaway. Isso responde o porquê escalei poucos filmes deste para exibições do cineclube, foram apenas duas outras vezes, O Bebê Santo de Mâcon e Afogando em Números, ambos traduzidos com não pouca dificuldade por este aprendiz de colunista quando ainda começava a me envolver com este trabalho. Em ambas as ocasiões, senti dores ao perceber o desdém de alguns no ofício de não tentar entender aquela amálgama de pequenos enigmas artísticos e matemáticos, o que me fazem rever seus filmes como um arqueólogo em busca de pequenas pistas que levam a grandes tesouros. São os já famosos “eastern eggs” só que embutidos no próprio filme muito antes de terem essa denominação.

Mesmo assim, creio que mesmo silenciosos, nas sessões anteriores nasceram outros arqueólogos, que como disse um crítico britânico, apreciam a ação do boticário dentro de açougues, uma bela metáfora para o uso da arte barroca requintada em choque com a violência mundana e a sexualidade bestial, elementos caríssimos na obra de Greenaway.

Até para que talvez mais se interessem em não ver com superficialidade a obra do diretor, duas coisas são imprescindíveis, a primeira, a epígrafe deste texto, a segunda, o filme deste sábado: O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante, um dos filmes do inglês com o enredo mais simples, embora combinando as duas coisas ver-se-á que o enredo é o que menos importa.

O título já revela muito, há um criminoso que freqüenta todos os dias o mesmo restaurante que ele mesmo banca e onde trabalha seu chef favorito. A mulher do criminoso é uma mulher elegante que freqüentemente sofre abusos do marido grosseirão e acaba se apaixonando por um cliente do restaurante, tendo encontros com este no próprio lugar, alcovitados pelo cozinheiro. O violento marido ao descobrir arma uma cruel vingança, mas não conta com o fato que sua esposa pode ser calculista quando atacada.

Greenaway usa uma história simples para com ela destilar inúmeras metáforas requintadas e com o auxilio da direção de arte, fotografia, figurino e trilha sonora construir verdadeiras pinturas em movimento, enchendo os olhos e satisfazendo os paladares mais requintados, ao mesmo tempo, lhe dando água na boca e minutos depois lhe exigindo um estômago dos mais fortes.

O filme “O Cozinheiro, o Ladrão, Sua Mulher e o Amante” será exibido neste sábado dia 26/07 às 19:30h no SESC Cineclube Silenzio. A entrada é gratuita

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Mulher e a Traição Avant-Garde

Laysmara Carneiro Edoardo

Socióloga

laysedoardo@gmail.com

"Os lábios da meretriz destilam favos de mel, e as suas palavras são mais suaves do que o azeite; mas o fim dela é amargo como o absinto. A infidelidade, ainda que possa ser excitante e doce no seu início, costuma ter um fim amargo como a losna."

Provérbios 5, 1-4

Peter Greenaway e toda a sua produção, exigem muita reflexão, e isso, desde a construção da narrativa ao comportamento das personagens, considerando-se o fato de sua produção cinematográfica vir carregada de elementos exteriores a ela mesma, o que exige do espectador, o máximo da atenção. Neste caso, principalmente no que diz respeito ao inter-relacionamento de o Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante, no filme de mesmo título, considerar apenas a aparência da interação faz com que o ambiente e a própria narrativa percam parte de seus sentidos. Ora, é fundamental levar em conta a profundidade do trato na existência das personagens e suas funções “no mundo”, por exemplo, pela mudança de emoções presente na troca de cores e figurinos da personagem que transita entre as salas do restaurante, haja vista o fato de que ela (no caso a mulher) pode ser considerada o elemento central da interação entre os demais.

Tendo em mente tais fatos, da profundidade simbólica do filme e da personagem feminina como bedel da narrativa, é preciso considerar diversos vieses para realizar uma breve e modesta análise sociológica, sabendo-se que além da questão de gênero envolvida no caso há outros fatores, tais como posições e papéis sociais, emoções pessoais, subversão, etc. Aliás, como dito, Greenaway não consegue ser simples, aborda inclusive a vivência de suas personagens de forma complexa, pinçando por vários ângulos a tomada de decisões daquelas, no mais das vezes por caminhos bastante atípicos aos olhares mais desatentos.

Além do mais, as situações apresentadas por Greenaway, principalmente no que diz respeito às mulheres, partem geralmente de uma figura passiva, simples e superficial que no decorrer dos acontecimentos, transforma-se num sujeito ativo e determinado, talvez mais sádico do que aquelas criadas por Nelson Rodrigues. De todo modo, este inter-relacionamento citado faz mais sentido dentro do contexto fílmico, pois como dito, muito do que pode ser tomado para a interpretação, vêm dos aspectos visuais, e arquitetônicos utilizados pelo diretor.

Talvez, para finalizar, seja interessante ainda citar uma importante questão, aqui emprestada do filósofo Gilles Deleuze, a respeito do regime de traição universal, onde um traidor volta-se contra todos os trapaceiros em um movimento duplo, de separação, onde enquanto o trapaceiro tem algum futuro (e não devir, nas palavras do autor) o traidor rompe com o antigo estado de coisas e consegue dar origem a algo novo, idéia esta que amplia um pouco mais a perspectiva discutida e dá nome ao papel da mulher no filme de Greenaway.***

18.7.08

19/07 - Faça a Coisa Certa (Spike Lee)

AVISO: Devido as pequenas platéias do ciclo anterior e às atividades culturais no 2º Festival Internacional de Cascavel, não haverá CICLO GRANDES COMEDIANTES na semana que vem.


NESTE SÁBADO DIA 19/07 às 19:30h
No SESC Cineclube
ENTRADA GRATUITA


Negros e brancos entram em choque dentro de uma pizzaria, após um longo dia de verão. Spike Lee, também autor do roteiro, baseia-se num episódio verídico para discurtir e polemizar sobre os conflitos raciais nos EUA. Exibido no festival de Cannes, o filme consagrou de vez o diretor, que também ganhou uma indicação ao Oscar® pelo roteiro. Exibido no festival de Cannes, o filme consagrou de vez o diretor, que também ganhou uma indicação ao Oscar® pelo roteiro.
Gênero Drama
Atores Danny Aiello, Ossie Davis, Ruby Dee, Richard Edson, Giancarlo Esposito, Spike Lee, Rosie Perez, John Turturro, Bill Nunn, John Savage,
Direção Spike Lee,
Idioma Inglês, Espanhol,
Legendas Português
Ano de produção 1989
País de produção Estados Unidos,
Duração 120 min.
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Fazendo a Coisa Certa

Vander Colombo

Não, desta vez vou tentar não ser redundante, principalmente se tratando de fatos históricos. Afinal, todos sabem que os negros sofreram um genocídio inalterável há séculos, todos sabem o quanto foram humilhados e explorados sob a sombra de instituições que os declaravam pessoas sem alma.

Mas se todos sabem, por que o genocídio ainda ocorre de maneiras disfarçadas? Por que continuam sendo humilhados e explorados seja economicamente seja nos programinhas “quero ser Mussolini” que povoam nossa televisão local no horário do meio-dia? Por que as religiões afro são duramente estigmatizadas, “jocosisadas” e relegadas a clandestinidade por um cristianismo que ainda não lhes concedeu alma?

Interpelar essas retóricas parece ter sido a missão de vida do diretor afro-americano Spike Lee principalmente em sua primeira fase, onde Faça a Coisa Certa figura como baluarte principal.

Neste em especial, ele coloca numa dura batalha, estigmatizados versus estigmatizados, italianos, coreanos, latinos e negros num único bairro de Nova Iorque onde parecem terem sido programados para matarem-se entre si enquanto fingem conviver em harmonia, mas não precisamos ir tão longe, segundo depoimentos no documentário de Kátia Lund, Notícias de uma Guerra Particular, desde que “desprovidos” foram isolados em favelas no Brasil, houve violência, porém essa violência só se tornou manchete quando desceu o morro e atingiu a classe média, por conta disso, o sonho desta, da policia e dos demais “cidadãos”, é que eles (os miseráveis) voltem a se matar entre si apenas, para que aqueles continuem sonhando viver num país desenvolvido.

Nisso, Faça a Coisa Certa funciona como um conto moral para todos os povos. Bedford-Stuyvesant, Brooklyn, a maioria dos habitantes do bairro são negros e latinos, a região é umas das mais pobres da Grande Maçã. Numa pizzaria, no dia mais quente do ano, os ânimos começam a se inflamar quando um ativista negro reclama que o estabelecimento do ítalo-americano tem apenas fotos dos descendentes daquele na parede de celebridades, nenhum afro-americano. Isso, associado ao pavio curto causado pelo calor é que vai acender a bomba que cada qual trazia escondida sob quilos de hipocrisia.

Uma das cenas que mais assustou na época do lançamento limita-se a personagens de todas as etnias espumando ofensas uns aos outros olhando para a câmera. Mais catártico impossível.

É assim que Spike Lee consegue ser imparcial e justifica o porquê tentar resolver tudo com um aperto de mãos, tão pregado pelo cinema ianque, é apenas um samba de banquelo doido, isso para uma etnia destroçada por mais de meio século seria novamente render-se e voltar pra “favela”, pro “bairrão” numa diária exploração. O que começou com sangue não irá se resolver com pombos.

Por conta disso, o filme é tão perigoso quanto necessário, e evoca a racionalização da Coisa Certa, o que logicamente nunca terá o mesmo sentido para todos.

O filme Faça a Coisa Certa será exibido neste sábado dia 19/07 às 19:30h às 19:30 no SESC Cineclube Silenzio, a entrada é gratuita.

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Ciências Sociais e o Preconceito,

ou a tentativa de fazer a coisa certa

Laysmara Carneiro Edoardo

Socióloga

laysedoardo@gmail.com

O homem de agora é como a multidão: ativo e imediato. Não pensa, faz, não pergunta, obra, não reflete, julga.

João do Rio

Para iniciar qualquer discussão a respeito do filme Faça a Coisa Certa é preciso retornar à gênese das Ciências Sociais, inclusive sobre seu caráter bastante sectarista na época, apesar de realizar-se como um fenômeno bastante inusitado e progressivo. A propósito, cabe aqui lembrar que Auguste Comte, fundador da ciência sociológica, foi o responsável por forçar a distinção entre ciências da natureza (físicas e biológicas) das ciências do homem social, tendo como mote o fato de o objeto de estudo de tal área do conhecimento exigir diferente abordagem. A partir daí, algumas considerações sobre o homem moderno, sabendo-se, entre outros fatos, submetido ao nascimento da indústria e dos Estados-Nação, por exemplo, direcionaram-se para a fundamentação de tal mudança histórica e de todas as suas conseqüências, positivas e negativas.

Anos mais tarde, com o avanço do desenvolvimento, a Antropologia também se legitima como ciência social, apresentando novos argumentos racionais e científicos, a fim de justificar determinados fatos. Sendo eles os que merecem um pouco mais de atenção nesta discussão. Ora, a Antropologia, hoje, a ciência das culturas, das diferenças, da pluralidade, foi utilizada em sua infância para alicerçar concepções evolucionistas entre os povos, tendo como pedra fundamental a famigerada concepção da distinção negativa entre primitivos e civilizados, “autorizando” ao último grupo a dominação dos “menos capazes”.

Hoje, após muitos estudos sobre ambos os grupos e a superação de terminologias tais como “evolução” e “raça” (substituída por etnia), além de alguns tropeços, reconheceu-se uma infinidade de coletivos, identidades e outras peculiaridades, embora ainda perdure, por parte dos grupos, posicionamentos preconceituosos que vão da expressão sexual à etnicidade, religiosidade, classe social, gosto musical e assim infinitamente.

As Ciências Sociais nasceram em um período turbulento, e mesmo sem querer, fundamentaram o preconceito alheio, esforçando-se hoje, com a ajuda de muitos aliados, tal qual Spike Lee, diretor de Faça a Coisa Certa, para dar conta das diferenças, sem contudo, causar distância. Aliás, destaque para a seqüência em que diversas personagens (de diversas etnias) exprimem seus sentimentos com relação aos demais, vozes não menos autorizadas do que aquelas que disputam espaço no mundo real.

13.7.08

14-18/07 - Mini-Ciclo Grandes Adaptações

14/07 - O GRANDE GATSBY (F. Scott Fitzgerald)

A romântica e luxuosa visão do que foram os anos 20 segundo o escritor F. Scott Redford faz Jay Gatsby, um sujeito que sucumbiu a alta sociedade com suas rigorosas regras de etiqueta e perdeu seu amor (Mia Farrow)para um rapaz endinheirado. Mas Gatsby misteriosamente ficou rico da noite para o dia e alimenta as esperanças de ser reconhecido por seu antigo amor, Daisy Buchanan.

O Grande Gatsby
ROBERT REDFORD MIA FARROW
BRUCE DERN



Tempo: 143 minutos Cor: Colorido
Ano de Lançamento: 2003
Recomendação: 14 anos Legenda: Português
Diretor: JACK CLAYTON

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15/07 - O PROCESSO (Franz Kafka)

Em uma manhã qualquer, Joseph K. (Kyle MacLachlan) acorda com a presença de dois homens que o informam que ele está preso. Em liberdade, ele aguarda seu julgamento, passando a conviver com o medo e a angústia, enquanto tenta provar que é inocente. Este seria um enredo comum se não fosse por um único detalhe: Joseph K. não faz idéia do crime que cometeu e todos os detalhes da acusação são sigilosos, sendo apenas conhecidos pela Corte Suprema que o julgará. Segunda e melhor adaptação cinematográfica do livro de mesmo nome de Franz Kafka (1883-1924) - a primeira foi feita em 1962 pelo diretor Orson Welles -, O Processo é um filme extremamente bem cuidado e fiel ao texto do autor tcheco, contando com interpretações impecáveis, com destaque para o veterano Anthony Hopkins.

Gênero Drama
Atores Kyle MacLachlan, Anthony Hopkins, Jason Robards Jr., Jean Stapleton, Polly Walker, Alfred Molina, Juliet Stevenson, Michael Kitchen, Patrick Godfrey, Ondrej Vetchý,
Direção David Jones,
Idioma Inglês,
Legendas Português,
Ano de produção 1993
País de produção Inglaterra, Estados Unidos,
Duração 120 min.


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16/07 - MISTÉRIOS E PAIXÕES (Almoço Nu de William S. Burroughs)

Com esta adaptação de Almoço Nu, o romance considerado infilmável de William S. Burroughs, David Cronenberg (realizador de Scanners, Videodrome e A Mosca) faz seu filme mais delirante. Peter Weller (Robocop) vive Bill Lee, um escritor fracassado, que extermina insetos para pagar suas contas. Bill está tendo problemas no trabalho, correndo o risco inclusive de perder o emprego, pois frequentemente esgota seu estoque de inseticida. Porém, a verdade é que Joan (Judy Davis), sua esposa, está viciada no "barato" que este pó lhe causa. Quando Bill, estimulado pela mulher, experimenta esta substância ele entra em um processo interminável de "viagens", nas quais máquinas de escrever se transformam em enormes insetos falantes.

Gênero Drama
Atores Peter Weller, Judy Davis, Ian Holm, Julian Sands, Roy Scheider, Monique Mercure, Nicholas Campbell, Michael Zelniker, Robert A. Silverman, Joseph Scorsiani,
Direção David Cronenberg,
Idioma Inglês,
Legendas Português, Espanhol,
Ano de produção 1991
País de produção Canadá, Inglaterra,
Duração 115 min.


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17/08 - A HORA DA ESTRELA (Clarice Lispector)

Macabéa, uma imigrante nordestina semi-analfabeta, trabalha como datilógrafa numa pequena firma e vive numa pensão miserável. Conhece casualmente o também nordestino Olímpico, operário metalúrgico, e os dois começam um casto e desajeitado namoro. Mas Glória, esperta colega de trabalho de Macabéa, rouba-lhe o namorado, seguindo o conselho de uma cartomante. Macabéa faz uma consulta à mesma cartomante, Madame Carlota, e esta prevê seu encontro com um homem rico, bonito e carinhoso.

Ficha Técnica

Título Original: A Hora da Estrela
Gênero: Drama
Duração: 96 min.
Lançamento (Brasil): 1985
Distribuição: Embrafilmes
Direção:
Suzana Amaral
Roteiro: Suzana Amaral e Alfredo Oroz
Produção: Raiz Produções Cinematográficas
Música: Marcus Vinicius
Fotografia: Edgar Moura
Desenho de Produção: Clóvis Bueno
Figurino: Clóvis Bueno
Edição: Idê Lacreta

Elenco


Marcélia Cartaxo
José Dumont
Tamara Taxman
Fernanda Montenegro
Denoy de Oliveira
Sônia Guedes
Lisette Negreiros
Cláudia
Humberto Magnani

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18/07 - RICARDO III (William Shakespeare)
Transposição para as telas do cinema da peça escrita por William Shakespeare. Com Ian McKellen, Annette Bening, Kristin Scott Thomas e Robert Downey Jr. Recebeu 2 indicações ao Oscar. A história shakespeareana do traiçoeiro usurpador do trono ganha novos contornos numa visão moderna, na qual o personagem principal é retratado como um ditador fascista.

Título Original: Richard III
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 103 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1995
Site Oficial:
www.mgmua.com/richard/index.html

Estúdio: United Artists / Bayly/Paré Productions Distribuição: MGM Direção: Richard Loncraine Roteiro: Richard Loncraine e Ian McKellen, baseado em peça de William Shakespeare Produção: Stephen Bayly e Lisa Katselas Paré Música: Geoff Alexander, Colin Good, Trevor Jones e Julian Kershaw Direção de Fotografia: Peter Biziou Desenho de Produção: Tony Burrough Direção de Arte: Richard Bridgland e Choi Ho Man Figurino: Shuna Harwood Edição: Paul Green Efeitos Especiais: The Moving Picture Company seta3.gif (99 bytes) Elenco Ian McKellen (Ricardo III) Annette Bening (Rainha Elizabeth) Kristin Scott Thomas (Lady Anne) Jim Broadbent (Buckingham) Robert Downey Jr. (Rivers) Maggie Smith (Duquesa de York) Nigel Hawthorne (Clarence) Jim Carter (Hastings) Dominic West (Richmond) John Wood (Rei Edward) Bill Paterson (Ratcliffe) Adrian Dunbar (Tyrell) Kate Steavenson-Payne (Princesa Elizabeth) Matthew Groom (Jovem príncipe) Marco Williamson (Príncipe de Gales) Roger Hammond (Arcebispo)
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MUDANÇA DE PLANOS - TEREMOS SIM, NA SEMANA QUE VEM O CICLO GRANDES COMEDIANTES.

9.7.08

12/07 - Sob o Domínio do Medo (Sam Peckimpah) + Ciclo Grandes Adaptações

Neste Sábado dia 12/07 às 19:30h>
No SESC Cineclube Silenzio
ENTRADA GRATUITA



Tudo o que o pacato matemático americano David Sumner (Dustin Hoffman) queria quando se mudou para uma fazenda no interior da Inglaterra com sua jovem esposa Amy (Susan George) era paz e tranqüilidade para terminar seu livro. Mas seu sonho de encontrar o lugar perfeito se desfaz quando os homens que contratou para reformar sua garagem começam um jogo de intimidação e medo, progressivamente invadindo sua casa e desrespeitando o casal. David vai ser posto em uma dura provação e será levado até o limite para defender seu lar, sua honra e sua esposa. Marcante e perturbador, com brilhantes atuações de Dustin Hoffman e Susan George, em um dos melhores filmes de Sam Peckinpah.
Gênero Suspense
Atores Dustin Hoffman, Susan George, Peter Vaughan, T.P. McKenna, David Warner, Colin Welland, Cherina Mann, June Brown, Donald Webster, Chloe Franks, Peter Arne, Jim Norton,
Direção Sam Peckinpah,
Idioma Inglês,
Legendas Português
Ano de produção 1971
País de produção Inglaterra,
Duração 118 min.
LEMBRANDO QUE NO DIA 14/07 COMEÇA O CICLO GRANDES ADAPTAÇÕES
O GRANDE GATSBY, O PROCESSO, ALMOÇO NU, RICARDO III
- no domingo, a programação completa

Sam Peckimpah:

Decifra-me ou devoro-te

Vander Colombo

É uma tarefa ingrata falar do filme Sob o Domínio do Medo de Sam Peckimpah, principalmente porque é uma incógnita falsamente decifrada pela burlesca crítica brasileira.

Os mais moralistas dizem se tratar de “um homem pacífico tendo que recorrer a atitudes drásticas em meio a uma situação violenta”, balela! Seria uma desonra à memória do diretor dizer que ele trataria uma narrativa sua de forma tão banal e simplista. O fato é que Peckimpah, já foi chamado de tudo, de esteta da violência, de machista chauvinista, de bruto, e sinceramente nem sei se ele se importava em defender-se dessas acusações, pois sua área com certeza, sempre foi o universo masculino, seja fraternal, seja misógino quando seu personagem lhe pede. Sob o Domínio do Medo trata, falando “diegeticamente”, sobre a transformação do primeiro no segundo, por força de terceiros.

Quando David (Dustin Hoffman) um matemático americano chega de mudança junto com sua sexy esposa à cidadezinha natal desta, no interior da Inglaterra, já é um prenúncio da disputa masculina que irá se seguir e logo se sabe também que irá haver sangue.

David é um intelectual, tem bons modos, é um típico gentleman nova-iorquino, é casado com uma mulher sensual que porém, digamos, não desfruta dos mesmos dotes cerebrais dele. (é disso que em geral as mulheres desgostam, as personagens femininas de Peckimpah de um modo geral são vilanescas, porém isso nada mais é, que uma artimanha de intensificação do universo fálico, que permeia a obra do diretor, a saber que esse incomodou mais que outros pois na maioria era westerns onde esse desenho de personagem feminino é comum.) Logo, os brutalizados habitantes do proletariado local já colocam os olhos sobre a bela moça que retorna e parece insatisfeita com seu marido fraco (para eles, em todos os sentidos).

Uma prova deste universo de Peckimpah é francamente exemplificada em todas as cenas aonde David vai ao bar a querer se enturmar ou enfrentar os homens locais. A guerra de testosterona tipificada nos homens brutos e fortes contra o intelectual débil. Porém é aí que Peckimpah se encaixa num perfeito intermédio, suas metáforas são cínicas e corrosivas, e acabou sendo isso o que mais incomodou, causando tanto a esse quanto a Laranja Mecânica de Kubrick, uma proibição de décadas.

Seja na representação do animal hibernado que acorda quando se liberta das amarras sociais que definem seu comportamento, ou na crítica implícita da sociedade americana reservadamente excêntrica, porém extremamente violenta quando seu espaço é invadido, ou ainda pela defesa da chamada TFP versus proletariado. O certo é que Peckimpah forjou um filme de múltiplas conclusões e colocou com esse, seu nome no hall dos melhores diretores reacionários ianques, esbanjando habilidade de direção, roteiro e direção num filme que leva a tensão até seu extremo para encerrar com os 20 minutos que figuram entre os mais brutais e crus da história do cinema.

O filme Sob o Domínio do Medo, será exibido neste sábado dia 12/07 às 19:30h

No SESC Cineclube Silenzio.

A entrada é gratuita.

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Diferentes, Desiguais e Desconectados

Laysmara Carneiro Edoardo

Socióloga

laysedoardo@gmail.com

“Deus sabe que, entre gatos e pombos, eu sou francamente pela primeira espécie. Acho os pombos um povo horrivelmente burguês, com seu ar bem-disposto e contente da vida, sem falar na baixeza de certas características de sua condição, qual seja a de, eventualmente, se entredevorarem quando engaiolados.”

Vinicius de Moraes

Diferentes, desiguais e desconectados” é o título de um livro do sociólogo mexicano Nestor Garcia Canclini, que me utilizo nesta situação para definir a situação a qual estão sujeitos os indivíduos em mesma circunstância da vivida pelas personagens de Sob o Domínio do Medo. No filme, o casal protagonista muda-se para uma cidadezinha inglesa e é logo estigmatizado, sofrendo dos demais moradores, as implicações de serem outsiders. E é Norbert Elias quem discute profundamente a relação entre os Estabelecidos e Outsiders, por coincidência, também em uma pequena cidade inglesa, apontando que tal dicotomia está presente em praticamente todos os âmbitos da sociedade, de forma que reflete a construção das hierarquias classificatórias e/ou ordens de status presentes nas relações sociológicas.

Vale como “superior” a imagem do grupo de estabelecidos (estabelecidos de uma forma ou outra, seja econômica, social, tradicional ou legitimada por qualquer outro aspecto) que se sobrepõe aos demais grupos, através de mecanismos de violência simbólica, que podem, deste modo, ser considerados como manifestações de relações de poder, que vão além das instâncias meramente institucionais de legitimação. Trata-se de um enfrentamento de grupo a grupo e de pessoa a pessoa.

A exclusão e estigmatização a que estão sujeitos todos os grupos e indivíduos, que, logicamente, dependentes da relação com os demais, excluem e estigmatizam da mesma forma que são excluídos e estigmatizados, fazem com que seja percebida a presença de solidariedade, uniformidade, normas e autodisciplina dentro do grupo dos estabelecidos e o conseqüente aspecto referente aos mecanismos de controle para a manutenção do pertencimento à determinada comunidade, tendo em vista a integração dos pertencentes e a exclusão dos indesejáveis.

No que diz respeito ao funcionamento das comunidades outsiders é possível perceber a influência da opinião dos estabelecidos sobre essa, mais do que a própria exclusão realizada pela última, de forma que orientam a manifestação de superioridade a partir do mérito e do carisma e conseqüentemente da manutenção do controle comunitário por sobre os “inferiores”, que suprimidos acabam em muitos casos percebendo a si próprios como tais.

Tendo em vista que diversos fatores são determinantes para a conformação de tal fenômeno, é preciso levar em conta que o entendimento sociológico deve dar conta também de um emaranhado de concepções, figurações e fantasias coletivas e individuais que influencia os relacionamentos entre comunidades e indivíduos por meio das auto-imagens e das imagens que se tem dos demais.

3.7.08

05/07 - Cova Rasa (Danny Boyle)

Neste sábado dia 05/07 às 19 hrs
No SESC Cineclube Silenzio
ENTRADA GRATUITA






Ficha Técnica

Título Original: Shallow Grave
Gênero: Suspense
Tempo de Duração: 89 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1994
Estúdio: Channel Four Films / Figment Films / PolyGram Filmed Entertainment / The Glasgow Film Fund
Distribuição: Gramercy Pictures
Direção: Danny Boyle
Roteiro: John Hodge
Produção: Andrew Macdonald
Música: Simon Boswell
Direção de Fotografia: Brian Tufano
Desenho de Produção: Kave Quinn
Direção de Arte: Zoe MacLeod
Figurino: Kate Carin
Edição: Masahiro Hirakubo


Elenco

Kerry Fox (Juliet Miller)
Christopher Eccleston (David Stephens)
Ewan McGregor (Alex Law)
Ken Stott (Detetive)
Keith Allen (Hugo)
Colin McCredie (Cameron)
Victoria Nairn (Visitante)
Gary Lewis (Visitante)
Jean Marie Coffey (Goth)
Peter Mullan (Andy)
Leonardo O'Malley (Tim)


Sinopse Alex (Ewan McGregor), David (Christopher Eccleston) e Juliet (Kerry Fox), que dividem um apartamento, concordam em permitir que Hugo (Keith Allen), um desconhecido, vá morar com eles, mas logo ele aparece morto, vítima de overdose. Entre seus pertences existe uma mala cheia de dinheiro, que faz com que a vida deles seja alterada de forma brutal.


Curiosidades - Cova Rasa é o primeiro filme do diretor Danny Boyle. - Após Cova Rasa, o ator Ewan McGregor e o diretor Danny Boyle trabalharam ainda em outros dois filmes: Trainspotting - Sem Limites (1996) e Por Uma Vida Menos Ordinária (1997)