4.6.08

07/06 - O Casamento de Muriel (P.J. Hogan)

Neste Sábado dia 07/06 às 19:30h
no SESC Cineclube Silenzio
ENTRADA GRATUITA

O Casamento de Muriel (Muriel's Wedding)
Menosprezada pelo pai e rejeitada por suas amigas, Muriel é uma jovem cujo sonho de realização e sucesso pode ser traduzido em uma única palavra: casamento. Em sua luta para ser aceita e escapar de sua triste rotina, ela tenta de tudo. Para aliviar os momentos de frustração, faz das músicas da banda Abba seu refúgio contra a solidão. O que ela ainda não sabe é que grandes surpresas, alegrias e fortes emoções estão à sua espera nesta deliciosa e nada convencional comédia que, acima de tudo, celebra a amizade, os sonhos e a busca pela realização pessoal. Um filme de grande sucesso de público e crítica, que revelou ao mundo o diretor P. J. Hogan (O Casamento de Meu Melhor Amigo, Peter Pan 2000) e a atriz Toni Collette (O Sexto Sentido e Connie e Carla, as Rainhas da Noite).
Gênero Comédia
Atores Toni Collette, Rachel Griffiths, Jeanie Drynan, Gennie Nevinson Brice, David Van Arkle, Lapaine Tania, Steve Smith, Genevieve Picot, Daniel Lapaine, Rob Steele, Richard Morecroft, John Walton,
Direção P. J. Hogan,
Idioma Inglês,
Legendas Português
Ano de produção 1994
País de produção Austrália,
Duração 105 min.

Os Casamentos de P.J. Hogan

Vander Colombo

Em plena era de contestações diretas e sem rodeios, alguém ainda se incomodaria em disfarçar suas idéias em glacês de gênero? P.J. Hogan sim, o australiano que deu vida à última versão do clássico Peter Pan, sempre esteve ligado à contracultura, apesar de seus filmes serem um misto entre a comédia romântica e o melodrama - ainda que poucos saibam disso e prefiram a facilidade de encaixá-lo como apenas mais um no cinema hegemônico.

Quando Hogan (marido da também cineasta Jocelyn Moorhouse do suspense “A Prova”) dirigiu O Casamento do Meu Melhor Amigo já com elenco estrelar, poucos sabiam que ele já havia falado de um outro casamento antes disso, o de Muriel. O filme que se chama justa e simplesmente O Casamento de Muriel está mais para os filmes da fase sueca de Lasse Hallstrom, ou os de Todd Haynes do que para os filmes com Julia Roberts.

Muriel é a filha mais nova de uma família completamente hedionda, o pai, um político pilantra e adúltero, a mãe no limiar da insanidade e os filhos vagabundos, sustentados pelos desvios e subornos do primeiro. Digamos que Muriel, gorda, feia, cleptomaníaca e obcecada por casamentos é a mais normal deles.

Magnificamente interpretada por Toni Collete (O Sexto Sentido) em começo de carreira, é na vida de Muriel que nos fixamos e em sua já citada obsessão que a leva numa viagem a Sidney, onde os rituais de casamento servirão de alegoria para sua busca pelo autoconhecimento.

O modo de tratamento de Hogan, diferentemente do filme posterior, foi num clima brega assumido, para não ser apenas uma crítica a própria instituição do casamento, bem como aos padrões femininos de classe e beleza, ao ponto que paralelamente, o foco e a heroína são mulheres, a vilania é também em maior parte feminina.

Tudo bem que os tempos mudam e o que era brega, é hoje pós-moderno, como o fato de inserir ABBA na trilha sonora. Mas digamos por cima que O Casamento de Muriel é um exagero, todas os maiores hits do quarteto estão no filme e não gratuitamente. É certo que a subversão de Hogan é matemática e embalada em conceitos moralistas, o que o deixa ainda mais interessante. Assim como Frank Zappa na música, Hogan critica usando a língua do criticado, e o melhor de tudo, hoje em dia, financiado pelo próprio.

Você vai pensar, o que Hogan tem de subversivo hoje em dia fazendo Casamento do Meu Melhor Amigo e Peter Pan? Bom, seja pelo fato do personagem de Ruppert Everett ser de longe a figura mais sexy num mesmo filme que estão Julia Roberts e Cameron Diaz, (o que no meu caso como heterossexual me deixa no ponto certo de voltar a ler Freud) e pelas insinuações alegóricas de romance incestuoso num filme com linguagem infantil, creio que se poderia chamá-lo de subversivo, no melhor dos sentidos.

E é bom que se continue assim, Hogan não é um nome que figura no primeiro escalão hollywoodiano. É apenas mais um, porém é o que está mais perto da geração que deu gás a Cidade dos Sonhos na década de 70, como Scorsese, Copolla, Woody Allen entre outros; trabalha com orçamentos nem modestos nem grandiosos, tem um público lucrativo e nas entrelinhas destila seus venenos.

O cinema se não subversivo, não serve para mais nada senão entretenimento descartável. A comunicação massiva tem seus deveres que vão de encontro a desalienação e o “pensar diferente” de seu público, os EUA e mesmo o Brasil a usam como ferramenta de política e violência lobotomizada, então, nada melhor do que alguns lá no meio darem a entender pelo menos, que a coisa não é bem assim. Se eles pagarem, melhor ainda.

O filme “O Casamento de Muriel” será exibido neste sábado

dia 07/06 às 19:30h

no SESC Cineclube Silenzio

A entrada é gratuita.

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Casamento: Mulher e o Papel de Gênero

Laysmara Carneiro Edoardo

Socióloga

laysedoardo@gmail.com

Casamento é o destino tradicionalmente oferecido às mulheres pela sociedade. Também é verdade que a maioria delas é casada, ou já foi, ou planeja ser, ou sofre por não ser.

Simone de Beauvoir

Creio que o grande mote de O Segundo Sexo da filósofa Simone de Beauvoir, esposa do também filósofo Jean-Paul Sartre, seja a famosa frase: “Não se nasce mulher: Torna-se”. Em dois volumes, a autora, mesmo com todas as críticas antifeministas da qual é vitima, consegue dar vistas na construção histórica do papel social da mulher na sociedade moderna, reconstituindo todo o processo de edificação das regras de comportamento exigidos pela sua condição. Ou seja, e com maestria, diga-se de passagem, a autora relaciona sentidos e causalidades de comportamentos que hoje são naturais, e por isso, cobrados das meninas desde a pré-escola.

Um pouco disso pode ser visto na discussão sobre as castrações que a menina sofre desde pequena, ao ser proibida de fazer xixi em pé como os meninos ou de brincar sem roupas junto com eles, por exemplo. A autora discute tais fatos, logicamente levando em conta que os livros foram escritos em 1949, considerando que a menina ao ter de portar-se em conformidade ao vestido de seda ou organza que veste, cuidando sempre da higiene e limpeza do mesmo e da manutenção de seu penteado, faz-se com o tempo, literalmente um sujeito limítrofe, artificial. De modo que o comportamento que a obriga a sentar-se ‘direito’ para que a menstruação não apareça sob o vestido claro, confunde-se historicamente com os bons modos exigidos pela sua condição.

A partir daí, fica fácil deduzir o papel da mulher na instituição do casamento, pois de fato, para Beauvoir “não são as pessoas que são responsáveis pelo falhanço do casamento, é a própria instituição que é pervertida desde a origem”, haja vista o fato de que ainda, apesar da reconstrução virtual do gênero em torno do trabalho e da liberação sexual constituir a mulher como um indivíduo pleno vivendo em sociedade, tal qual o homem, tem-se o desejo de uma mulher que saiba dar conta de suas obrigações como esposa e mãe dentro do lar. Desta forma, “o casamento incita o homem a um imperialismo caprichoso; a tentação de dominar é a mais universal, a mais irresistível que existe; entregar o filho à mãe, entregar a mulher ao marido é cultivar a tirania na terra”.

Por outro lado, reciprocamente, há uma entrega não deliberada por parte da esposa, que embora deseje sua autonomia, muitas vezes satisfaz-se diante de seu empenho. As jornadas duplas, triplas, quádruplas... da qual a mesma é refém tornam-se objeto de orgulho da sua capacidade, de forma que o casamento, como uma união através do amor, rende, sem dúvida, um aglomerado de papéis sociais (todos estes incluídos no papel de gênero) cumpridos em nome de valores matriarcais na gestão de uma família patriarcal.

Para Beauvoir, “é certo que o papel sexual da mulher é, em grande parte passivo; viver imediatamente essa situação passiva não é tão masoquista como a atividade do macho é sádica; a mulher pode transcender as carícias, a comoção, a penetração para o seu próprio prazer…; ela pode também procurar a união com o amante e entregar-se-lhe, o que significa uma superação de si e não uma abdicação.” De mesmo modo, a função de mãe, principalmente no cuidado e na educação dos filhos, constituindo-se como objetivo mor da existência feminina, caracteriza-se também, de algum modo, como uma submissão.

Como ressalva, e levando em conta que Simone de Beauvoir também foi casada, é preciso levar em conta que ao escrever os livros, sua intenção era a de promover uma reconstituição da mulher como sujeito, tal qual ela mesma se colocava. A própria autora, na introdução de O Segundo Sexo coloca que deseja ser imparcial, olhando objetivamente a condição existencial das mulheres, de modo que as acusações e as críticas à submissão da qual a mulher é vitima não são nenhuma novidade, ainda mais nos dias de hoje, para as mulheres que pensam sua condição. Portanto, e considerando que, independente de ser uma construção histórico-cultural, toda mulher deseja se casar, e que em toda “ligação, ao estabilizar-se, acaba por assumir freqüentemente um caráter familiar e conjugal; [sendo que] nela se reencontram o tédio, o ciúme, a prudência, o ardil, todos os vícios do casamento”. Entretanto, toda mulher ainda pode, tal qual coloca a autora, retornando ao escopo do seu papel, sonhar “com outro homem que a tire dessa rotina”.

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