9.7.07

Salò ou Os 120 Dias de Sodoma (Pasolini) 1975

Próximo Sábado dia 14/07 às 19:30hrs

No SESC Cascavel/PR - Entrada Grátis

Salò ou os 120 Dias de Sodoma/

Salò o le Centoventi Giornate di Sodoma

Dirigido por Pier Paolo Pasolini

Itália/França, 1975 Cor - 108 min.

Com: Paolo Bonacelli, Giorgio Cataldi, Umberto P. Quintavalle, Aldo Valletti (dobrado p/ Marco Bellochio), Caterina Boratto, Elsa De Giorgi, Hélène Surgère Sonia Saviange, Giuliana Melis, Faridah Malik, Sergio Fascetti, Antonio Orlando

Os Senhores coordenam a operação de recolha das vítimas; jovens de ambos os sexos na flor da idade, que serão levados para a mansão onde hão-de decorrer as orgias, subordinadas a ciclos dantescos. Antinferno, Esperma, Merda, Sangue. Os ciclos da vida, e do sexo associado à alegria, são expressamente rejeitados por Pasolini, que assim compõe um filme em ruptura com ele próprio. Um filme sobre ciclos também, mas desta feita sobre ciclos de morte.

Transpondo «Os 120 Dias de Sodoma», do Marquês de Sade, para os últimos dias da ditadura fascista italiana, «Salò» não podia deixar de ser um filme violento, atroz, repulsivo. Porque é do que trata Pasolini na sua obra final; o fascismo. Violento. Atroz. Repulsivo. O sexo é agora um castigo; uma introdução às torturas finais, de que são merecedores todos aqueles que mereceram uma referência no livrinho de apontamentos dos detentores do poder.

O fascismo é explorado em todas as vertentes possíveis. O espaço fechado da mansão, a lei escrita - e reescrita - a bel-prazer pelos Senhores, o domínio absoluto sobre o "povo", a exigência total da conformidade dos comportamentos aos desejos dos dominadores, a censura, a denúncia e o colaboracionismo. Quanto à censura, não deixa de ser curioso - e por outro lado, algo óbvio - que a forma com que Pasolini fez revestir o filme tenha despertado tais ódios e perseguições, de pessoas que quiseram proibir exibições e até destruir negativos. Ainda hoje «Salò» está banido em alguns países.

Um dos terrores menos gráficos, é a nossa incapacidade de resistência à opressão e ao terror do domínio total do regime, que nos leva a ceder e a tornar-nos parte. A fuga ao pesadelo passa pela denúncia do vizinho, que é reconhecida e estimulada pelos Senhores. A sequência das denúncias no filme leva o espectador ao riso, e, no entanto, será das sequências menos caricaturais. É a partir daqui que se escolhem os eleitos, aqueles que serão levados para «Salò». Os que olharam o abismo e a quem o abismo devolveu o olhar.

No fundo, as atrozes orgias, poderiam não passar de um concurso, cujo prémio são "umas férias dos sonhos", em algum lugar, ligeiramente mais atroz daqueles que o regime nos oferece, mas em que ainda podemos rejeitar a participação. Simplesmente, as humilhações que se sofrem e as coisas que se comem, não são a troco da sobrevivência, mas de 15 ou 20 contos e de um reconhecimento público.

Extremamente desaconselhável para menores de 18 anos.

Contém cenas de:

Nudez total (masculina, feminina, adolescente, infantil);

Sexo;

Violência extrema;

Masturbação;

Ereção;

Blasfêmia;

Tortura;

Sadismo;

Barbarismo;

Sodomia;

Crueldade;

Homossexualismo;

Coprofagia e coprofilia;

Degradação e Humilhação;

"Um filme que jamais devia ter sido feito, mas foi ... e acabou por ser a sentença de morte de seu idealizador"

IMDB

3 comentários:

Cinda disse...

Continuando a saga de Saló, a exibição no cineclube não foi diferente, mais de 50% da sala se retirou esbravejando conforme o filme avançava.
Mal compreendido, vítima de pedras e comentários maldosos, Salò sempre será como um livro de Sade, que divide multidões. Despertando a ira em uns, excitação em outros, e a indiferença em ninguém.
Até mesmo pessoas mais esclarescidas sentiram-se desconfortáveis e sem saber como explicar tudo aquilo acabam apelando para conceitos mais fáceis como "filme de mal-gosto" ou até "devaneios homossexuais".

O fato é que nenhum outro filme foi tão fiel à obra do Marquês de Sade, mesmo sendo adaptado, do que Salò, e é claro, desperta os mesmos sentimentos que ela. E infelizmente, mesmo depois de centenas de anos, ainda ficará reservada a pouco que se dedicam a entendê-la ou pelo menos aceitá-la.

Gianfranco Marchi disse...

Realmente uma pena, Vander. Interessante como um filme tão profundo e multifacetado como Salò pode ser considerado "de mal gosto". Claro que ele é forte, pois denuncia uma situação política e social que, efetivamente, era de "mal-gosto". Eu acho-o uma realização corajosíssima e uma experiência única no cinema. Pasolini, num só filme, quebra todos os tabus imagináveis, pouco se importando com a "aceitação" do telespectador. Nesse aspecto, é extremamente íntegro e fiel ao seu objetivo e idéia original, completamente despreocupado com opiniões externas, que não devem comprometer o artista. Realmente, continuará sendo um filme para poucos. E talvez seja melhor assim.

Anônimo disse...

Sadismo... Eis a palavra que define Salò do inicio ao fim. Seja na minúcia ao descrever as perversões das personagens, seja ao forçar uma reação do público. Como dito nos dois comentários anteriores, não é possível ter o mínimo contato com tal DOCUMENTO sem se ter uma grande reação.

Pasolini conseguiu, poéticamente, definir um período histórico, transportando à uma linguagem acessível um tratado de tamanha grandeza que é a obra de Sade. Fez isso, criticando abertamente o ensandecimento da humanidade contemporânea, que em nome de um racionalismo ético, distribui atrocidades milimétricamente raciocinadas e refletidas.

Temos isso de forma muito clara, ao aproximar o ambiente de Salò ao pensamento do sociólogo francês Pierre Bourdieu, quando da crítica ao acúmulo de cultura erudita, dos signos reconhecidos à distância provedores de um pudor e tino à altura das posições ocupadas pelos seus detentores. Assim, a música, as obras de arte, as vestimentas, a etiqueta, etc. são elementos que definem o comportamento dos mesmos,que determinam as regras morais que devem ser seguidas pelos "súditos" (heranças religiosas por sinal) mas que por outro lado, aqueles, utilizando-se da racionalidade defendida por eles, determinam para si o formato das suas vontades.

Como diz o próprio Sade: "As grandes guerras que impuseram tão pesado fardo a Luís XIV esgotaram tanto os recursos do tesouro quanto do povo. Mas mostraram também a um bando de parasitas o caminho da prosperidade. Tais homens estão sempre a espreita de calamidades públicas, que não se preocupam em aliviar, antes procurando criá-las e alimentá-las a fim de que possam tirar proveitos dos infortúnios alheios."

Enfim, o "despudor" de Pasolini ao criticar a própria sociedade, a própria cultura (inclusive por nos dar um panorama atual de toda a organização social contemporânea) levou-o ao seu tão contestado e desvalorizado fim, e também à falta ao despudor do seu público em fechar os olhos desatentos à realidade fielmente apresentada por ele. Assim, acredito que outra citação do próprio Sade pode ser apropriada por ele enquanto prefirimos nos contentar com fugas megaproduzidas entre explosões e milhões de dólares do cinema "acessível".

"Só me dirijo às pessoas capazes de me entender, e essas poderão ler-me sem perigo."
(Marquês de Sade)